O FUNCIONALISMO PENAL MODERADO DE CLAUS ROXIN:QUAL O PAPEL QUE O DIREITO PENAL DEVE EXERCER PARA CUMPRIR COM A SUA FINALIDADE SOCIAL?

O FUNCIONALISMO PENAL MODERADO DE CLAUS ROXIN:QUAL O PAPEL QUE O DIREITO PENAL DEVE EXERCER PARA CUMPRIR COM A SUA FINALIDADE SOCIAL?

 

João Pedro de Carvalho Portinho[1]

 

  1. RESUMO

 

O presente trabalho tem como escopo o princípio da insignificância que resulta do princípio da intervenção mínima, que é uma consequência natural do princípio da legalidade, que surge historicamente na humanidade, como uma forma de limitação do poder punitivo do Estado, surge no contexto da revolução francesa, no Estado centralizado sendo este necessário para haver uma separação de poderes, que o limite do Estado deve ser controlado, sendo isso, uma das bases da democracia. E por conta disso Beccaria cria a ideia dos delitos e das penas e da legalidade,  que todo indivíduo somente pode ser punido se houver uma lei anteriormente definindo um fato típico e uma pena atribuída a este fato, descrição fática do princípio da legalidade, consistir em que deste último, se deriva o princípio da tipicidade, constituindo que na sua concepção original era a subsunção do fato a norma, que com a teoria finalista se transfere da culpabilidade para a tipicidade e o dolo passa a ser um componente do tipo penal. Posteriormente vem a ideia de Welsen com a tipicidade material, que a tipicidade não seria a mera subsunção do fato a norma, mas que necessita de uma valoração a ofensa ao bem jurídico tutelado, que finalmente surgem com ClausRoxin, que articula: se tudo isso é verdade, se o direito penal está submetido ao princípio da legalidade, se em decorrência deste princípio existem as regras do princípio da fragmentariedade e da subsidiariedade, e se a tipicidade é uma consequência do citado princípio da legalidade, se tudo isso é fato, só pode ser típico aquele ato que ofender relevantemente o bem jurídico tutelado pelo direito penal. Portanto relataremos estas implicações no funcionalismo penal moderado e o princípio da insignificância.

 

  1. INTRODUÇÃO

 

Neste trabalho será realizado uma investigação do funcionalismo Penal, teoria esta criada por ClausRoxin, buscando analisar as respostas dadas por ele aos seguintes temas: Qual o objetivo do Direito Penal?  Qual a finalidade do Direito Penal? Qual o papel que o Direito Penal deve exercer para cumprir com a sua finalidade social?

Tendo por base de repostas, outra teoria cuja sua efetivação foi atribuída a Welzen, o qual Roxin vem a aprimorar, é a teoria do bem jurídico tutelado, onde suas hipóteses serão: que o objetivo do direito penal é a efetivação dos princípios constitucionais penais, e a efetiva proteção aos bens jurídicos, que são mantedores de uma sociedade pacifica e ordeira.

Além disso, a finalidade deste ramo do direito, é de caráter civilizatória, e socializador, pois o punir é necessário, porem deve ser feito baseando-se em princípios, regras e um devido processo legal, para que na verdade, se tenha uma pena justa e proporcional e não um mero ato de punir.

          Dentro deste trabalho iremos discorrer sobre o funcionalismo penal, suas principais teses e argumentos em relação ao bem jurídico tutelado e por suas consequências naturais dos princípios do Direito Penal, tais como da últimaRatio, intervenção mínima, nullumcrimennullapoenasine lege, da legalidade e taxatividade.

          Explanando dentro da teoria de ClausRoxin, tanto o funcionalismo Penal, quanto o bem jurídico tutelado, adentrando nas principais interligações com o princípio da insignificância, com o fim de revelar qual o papel que o Direito Penal deve exercer para cumprir com a sua finalidade social.

 

 

  1. O FUNCIONALISMO PENAL DE CLAUS ROXIN

 

 O funcionalismo penal moderado é uma teoria idealizada por ClausRoxin, portanto consiste no referencial teórico desta pesquisa. A teoria tem o objetivo de solucionar os questionamentos já referidos em nossa introdução, que são: (a) qual o objetivo do Direito Penal? (b) qual a finalidade do Direito Penal? (c) qual o papel que o Direito Penal deve exercer para cumprir com a sua finalidade social?

Explorando a finalidade tanto social quanto o objetivo do Direito Penal, é possível afirmar que ele tem, para Roxin, o dever social de proteger bens jurídicos de real relevância para o convívio entre as pessoas. Desta forma, há o desígnio de assegurar que o Direito Penal não deve ser invocado por motivos banais, visando a questão principal do funcionalismo penal. Sendo assim, devemos ter a consciência que princípios como:  ultima Ratio, intervenção mínima, nullumcrimennullapoenasine lege, da legalidade e taxatividade, são primordiais para o objetivo e finalidade social do Direito Penal.

 

Não há dúvida de que o controle levado a efeito pelo Direito Penal é o mais rígido. Em face da sanção penal, restringe-se direta ou indiretamente o direito de liberdade do cidadão ou, em casos extremos, elimina a sua própria vida, o que ocorre, por exemplo, com a pena de morte. Trata-se, com efeito, de uma interferência do Estado na vida e na liberdade das pessoas (direitos fundamentais). Daí a imposição que se faz ao Estado - herança do Iluminismo - do cumprimento de determinadas exigências para a criação do Direito Penal, a exemplo do princípio da legalidade, anterioridade, proporcionalidade, taxatividade. Somente por meio de lei penal discutida, aprovada pelo Congresso Nacional (vontade geral) e sancionada pelo Presidente da República é que se pode proibir a prática de determinadas condutas e impor penas, lembrando sempre que a proibição não pode atingir fatos pretéritos. Vale dizer, o Estado, por meio do Direito Penal, em defesa do interesse social, está autorizado a interferir na liberdade do cidadão, porém, não a qualquer custo. "Os fins não justificam os meios" (Maquiavel). Deve-se obedecer àquilo que se rotula como Estado de Direito (agir dentro das regras jurídicas), tendo como premissas desse controle os princípios da dignidade da pessoa humana e da necessidade. (ROBALDO, 2009)

Consiste em imperativo, para Roxin, a simples percepção que o Código Penal não foi efetivado e vigorado com o intuito de abrigar a coletividade, mas sim de proteger os delinquentes da vida social, que tem como objetivo ser pacífica e ordeira. Portanto, é possível afirmar que o Direito Penal tem como dever, além de proteger bens jurídicos, também o de manter a sociedade em um convívio pacífico. Dessa forma, os delinquentes deste contrato social entre o Estado e a sociedade devem afirmar todas as garantias e princípios, para a concretização de um Direito e um Processo Penal equitativo e garantidor das regras (ROXIN. 2012, p. 3-4).

 

“Ideia de fim no direito penal”, (estudo no qual LISZT apresentou seu programa de Marburgo, que marcou uma época), é a estrela guia da política criminal, enquanto o código penal, como “magna carta do delinquente”, de acordo com a expressa declaração de LISZT, protege “não a coletividade, mas o indivíduo que contra ela se levantou” concedendo a este o direito “de só ser punido sob os pressupostos e dentro dos limites legais”. (ROXIN, 2012, p. 3)

 

Nesse sentido, o fidedigno desígnio do funcionalismo penal parece ser trazer à tona, que o Direito Penal não é um ingênuo meio pelo qual carecemos de punir o transgressor, pois temos a fidúcia que o punir é legal e necessário. Porém, a forma de punir deve ser materializada baseando-se nos aglomerados princípios tanto do Direito quanto do Processo Penal, afirmados na Carta Maior (ROXIN, 2012, p. 3-4).

Esta teoria de ClausRoxin é de vital estima para nosso trabalho, pois é o ponto de partida de todo desenrolar teórico, afiançando que o funcionalismo penal de ClausRoxin é a conjectura que se apoia do Princípio da insignificância, que é o objeto principal da pesquisa. 

Se exibirmos como veracidade que o Direito de punir do Estado deve ser restrito à Lei, é necessário que se atribua a uma determinada conduta a “face” de criminosa. Carece esta Lei em primeiro plano ser antecedente ao episódio fático da conduta.

Isso nos acena que o Direito Penal deve ser a última interposição do caráter punitivo do Estado, pois é a mais intensa delas. Desse modo, o Direito Penal dentro da mesma ótica também tem como desígnio social o caráter punitivo e ressocializador aos que rescindem o contrato social entre os cidadãos e o Estado, e puni-los se torna necessário para que o convívio retorne ao status de pacífico e ordeiro da sociedade.

 

A observância do Princípio da Intervenção mínima se constitui decorrência imediata do chamado Garantismo Penal, consubstanciado na aplicação constitucional do Direito Pena e, por isso, não se deve tolerar que ele sirva de instrumento único de controle social, sob pena de banalizar-se a sua atuação, que deve ser subsidiária, último remédio, última alternativa, a ‘ultima ratio’. (LUCAS, 2019)

 

Mas esta punição deve passar, obrigatoriamente, por um devido processo Legal inerente à imputação de uma pena em concreto. Isso deve ser intrínseco aos conglomerados princípios penais e constitucionais, para que se apresente uma legitimidade tanto do direito, quanto da pena, quanto do processo.

Em suma, o Direito Penal não é simplesmente punitivo: ele é a linha divisória entre a prepotência do poder punitivo estatal e os direitos individuais. Dessa forma, este ramo do Direito está sempre em contato com as tragédias humanas, e por exatamente este motivo deve ser o mais humanizado possível, uma vez que está presente em cada ato da vida social.

Portanto, a concretização do princípio da insignificância é uma construção teórica estrutural de um amontoado de princípios, tais como o princípio da legalidade, intervenção mínima e do bem jurídico tutelado, entre outros, de tal modo que, se todo crime deve ser regido por Leis, que se atribua uma determinada conduta à imposição de criminosa e a ela se comine uma pena. Devemos ter como certeza que esta conduta realmente afetou um bem jurídico tutelado de determinada forma que seja imprescindível para a manutenção do convívio social.

 

O princípio da legalidade, conhecido por meio da expressão latina nullumcrimen, nullapoenasine lege, que significa que 'não há crime, nem pena, sem lei anterior que os define', é muito importante no estudo do Direito, sendo um norteador para Leis e dispositivos. Esse princípio encontra-se em várias partes da Constituição Federal e também em Códigos Penais e outros documentos. (KERDNA. 2019)

 

Sendo assim, o chamamento do direito penal com o intuito de retomar o status ordeiro e pacífico, caso contrário esta conduta tida como delituosa formal, porém, não será material, pois não afetou o bem jurídico, ao ponto de que o Estado tenha que reprimir tal conduta com seu combatente mais intenso. (ROXIN. 2012)

 

O princípio da insignificância foi cunhado pela primeira vez por ClausRoxin, em 1964, que voltou a repeti-lo em sua obra Política Criminal y Sistema delDerecho Penal, partindo do velho adágio latino ‘minima non curatpraetor’. A tipicidade penal exige uma ofensa de alguma gravidade a bens jurídicos protegidos, pois nem sempre qualquer ofensa a esses bens ou interesses é suficiente para configurar o injusto típico. Segundo esse princípio, que Klaus Tiedemann chamou de princípio de bagatela, é imperativa uma efetiva proporcionalidade entre a gravidade da conduta que se pretende punir e a drasticidade da intervenção estatal. Amiúde, condutas que se amoldam a determinado tipo penal, sob o ponto de vista formal, não apresentam nenhuma relevância material. Nessas circunstâncias, pode-se afastar liminarmente a tipicidade penal porque em verdade o bem jurídico não chegou a ser lesado. (STF, 2019).

 

Deste modo, percorremos agora a teoria do funcionalismo penal de ClausRoxin, abalizando sua teoria de outra proposição com a mesma nomenclatura, porém com idealizações reversas, o funcionalismo penal radical deGuntherJakobs.

Esta seção será dedicada à apresentação da teoria de ClausRoxin, do funcionalismo Penal teleológico, considerando-se ser ela imprescindível para a futura compreensão das proposições do autor sobre o princípio da insignificância.

Começando por este tema, a teoria de ClausRoxin, do funcionalismo Penal moderado, denominada pelo conjunto de teorias que buscam explicar o Direito Penal e a forma de aplicá-lo, logo precisa ser explicada para que seja possível compreender o funcionalismo Penal, que existem duas principais teorias de autores diversos sobre este tema.

De um lado, temos o funcionalismo moderado, ou sistema racional final ou ainda sistema teleológico. Ambas nomenclaturas definema teoria de ClausRoxin, professor e Doutrinador da Universidade de Munique na Alemanha.

 

Roxin nasceu em Hamburgo, norte da Alemanha, em 15 de maio de 1931. Ainda bastante jovem, doutorou-se (1957) e habilitou-se (1962) – isto é, tornou-se livre-docente pela Faculdade de Direito da Universidade de Hamburgo, sob a orientação do Professor Doutor Heinrich Henkel. Henkel instigou Roxin a pensar as bases de reformulação do Processo Penal alemão, mas foi a Leitura de Welzel que levou Roxin a fixar como ponto central de suas reflexões o Direito Penal material. Logo, em 1963, com 32 anos, Roxin aceitou o convite da Universidade de Göttingen e tornou-se formalmente um Professor catedrático. A pouca idade com que Roxin habilitou-se foi um dos trunfos de sua carreira, já que lhe deu a possibilidade de orientar as teses daqueles que seriam os grandes Penalistas do futuro, como Schünemann, Rudolphi e Amelung, para mencionar apenas três grandes nomes. Roxin participou do grupo de jovens Penalistas que elaborou o célebre Projeto Alternativo de Código Penal em 1966, e, desde então, foi coautor de vários outros projetos alternativos, como os dois sobre a eutanásia e outros sobre a reforma do processo Penal. (GRECO, 2011, p. 98)

 

Porém, de outro lado, devemos citar a teoria do Penalista GuntherJakobs, professor e doutrinador na Universidade de Bonn, na Alemanha, que é definida como teoria do funcionalismo radical ou funcionalismo sistêmico. Porém, para este trabalho, iremos nos deter à teoria do funcionalismo moderado de Roxin. Dessa forma, somente iremos relatar brevemente a teoria de Jakobs com a finalidade exclusiva de situar o leitor (ROXIN, 2006, apresentação).

Deste modo, iremos discorrer a ideia geral do autor GuntherJakobs, uma vez que não é o escopo central de nosso trabalho, pelo simples motivo que sua teoria não admite o princípio da insignificância, pelos motivos que iremos explanar.

 

Assim, quem descumpre a Lei por não exercer um comportamento por ela regrado viola o sistema jurídico e, o sistema jurídico deve ser resguardado pelo Direito Penal, sob pena de se perder em sua essência valorativa. Para Jakobs, a proteção que se dá ao patrimônio pelo Direito Penal ao tutelar o furto simples (art. 155 do CÓDIGO PENAL) deve ser levada à sério. Caso haja um furto, não importa o valor do bem subtraído. Importa é que houve uma violação da Norma, frustrando a legítima expectativa que o titular do bem tinha de que ninguém subtrairia tal coisa. Assim, o Direito Penal deve incidir para garantir a vigência da Norma para todos os outros membros da sociedade pois, caso contrário (se o autor do furto não for punido) ninguém mais respeitará o patrimônio alheio. Vejam que o que se protege aqui é a NORMA. (PRADO, 2018)

O funcionalismo racial percebe o Direito Penal como um sistema autônomo, que respeita apenas seus próprios limites, isoladamente. Trata-se de um sistema de Normas e princípios autorreferentes que não depende de outros ramos do Direito. Portanto cria e utiliza suas próprias referências sendo autopoiético, pois o sistema Penal se renova por conta própria. Dessa forma, criando novos institutos quando for preciso e descartando-os quando não mais necessário. (URENA, 2019)

Logo depois, no mesmo sentido, GuntherJakobs também apresenta uma concepção Normativista do Direito Penal, porém, sob uma perspectiva diferente de Roxin. Para Jakobs, o Direito Penal está determinado pela função que cumpre no sistema social, tornando-se um sistema autônomo que tem suas próprias regras e a elas se submetendo. Jakobs reconhece, assim como seu mentor Hans Welzel, que o Direito Penal tem como função assegurar os valores éticos e sociais da ação, porém, muda o enfoque metodológico, levando aos extremos de uma 're-normatização' dos conceitos. "Jakobs, por sua vez, seguindo a Luhman, concebe o Direito Penal como um sistema normativo fechado, autorreferente (autopoiético) e limita a dogmática jurídico-penal à analise normativo-funcional do Direito Positivo, com a exclusão de considerações empíricas não normativas de valorações externas ao sistema jurídico-positivo." (URENA, 2019)

 

Para este doutrinador, a função do Direito Penal é a proteção da Norma. Para Jakobs, o Direito Penal só impõe autoridade quando suas Normas são duras e severamente aplicadas, de forma a intimidar a coletividade, tendo a noção que o delinquente reincidente contínuo não merece as garantias e princípios constitucionais e penais. (GRECO. 2012)

Como nos revela Rogério Greco em contraponto à teoria do funcionalismo Radical:

Não se educa a sociedade por intermédio do Direito Penal. O raciocínio do Direito Penal Máximo nos conduz, obrigatoriamente, à sua falta de credibilidade. Quanto mais infrações penais, menores são as possibilidades de serem efetivamente punidas as condutas infratoras, tornando-se ainda mais seletivo e maior a cifra negra. (GRECO, 2012)

 

Para que a sociedade possa extrair estes delinquentes de seu convívio, o Direito Penal pode retirá-lo sem qualquer direito ou garantia fundamental, até mesmo usando de artifícios como torturas e malefícios ardilosos com o intuito de proteger a sociedade e tirar este inimigo de seu meio, deixando claro que o delinquente é um reincidente contínuo. Ele não é mais considerado uma pessoa, mas sim um inimigo da sociedade e que deve ser retirado do convívio social. (GRECO, 2012)

Jakobs, por meio dessa denominação, procura traçar uma distinção entre um Direito Penal do Cidadão e um Direito Penal do Inimigo. O primeiro, em uma visão tradicional, garantista, com observância de todos os princípios fundamentais que lhe são pertinentes; o segundo, intitulado Direito Penal do Inimigo, seria um Direito Penal despreocupado com seus princípios fundamentais, pois que não estaríamos diante de cidadãos, mas sim de inimigos do Estado. (GRECO, 2012)

 

Contudo, um grande engano, segundo Beccaria: a certeza de um castigo, mesmo moderado, sempre causará mais intensa impressão do que o temor de outro mais severo, unido à esperança da impunidade (BECCARIA, 1999. P 87)

Um dos maiores travões aos delitos não é a crueldade das penas, mas a sua infalibilidade[...] A certeza de um castigo mesmo moderado, causará sempre impressão mais intensa que o temor de outro mais severo, aliado a esperança de impunidade. (BECCARIA, 1999)

 

Porém, de outra forma, a teoria do funcionalismo moderado teve seu início na década de 1970, quando Roxin publicou sua obra “Política Criminal e Sistema Político Penal”. Nela, o autor busca interpretar todos os institutos penais com base na política criminal e nas finalidades da pena, assim todas as categorias penais no qual fazem parte a tipicidade, antijuridicidade e a culpabilidade devem ser analisadas pelo escopo da política criminal e a finalidade da pena (ROXIN, 2006, p.78-79). 

 

 O Direito Penal tem por finalidade a proteção de bens jurídicos e não a proteção da moral. “... ao legislador não assiste Direito algum de punir um comportamento não lesivo de bens jurídicos, apenas por ser ele imoral. [...] O Estado tem de garantir a ordem externa; ele não está legitimado a ser patrono moral dos indivíduos”. Isso significava, especialmente, que proibições, como a do homossexualismo entre adultos, ainda contidas no Projeto Governamental sob o argumento da proteção da moral tornar-se-iam ilegítimas. (GRECO, 2011, p. 106)

 

A conclusão que fica, portanto, é que a função do Direito Penal é defender a sociedade dos riscos politicamente intoleráveis, ou seja, das ações socialmente inadequadas, vindo por tanto afirmar que o dever do Direito Penal é a proteção dos bens jurídicos socialmente relevantes (ROXIN, 2006, p.80).

Sendo assim a visão é que o Direito Penal deve estar sempre pronto para a defesa das pessoas, contudo, somente nos casos de ações intoleráveis perante a sociedade (ROXIN, 2006, p.80).

 

Mas as diferenças entre as concepções de sistema vão além: se considerarmos a ação típica como realização de um risco não permitido, é porque estamos deduzindo o comportamento jurídico-Penalmente relevante da tarefa do Direito Penal, de defender o indivíduo e a sociedade contra riscos sócios-politicamente intoleráveis. A ideia do risco vai, como se sabe, bem além da esfera da dogmática jurídico-Penal, e tematiza problemas fundamentais da sociedade moderna e de seu direcionamento (ROXIN, 2006, p.80).

 

         Tendo também a missão de definir a questão de política criminal, Roxin nos revela que política criminal é o conjunto de diretrizes através das quais pretende-se almejar os fins práticos ou operacionais do Direito Penal, traçando as metas deste Direito. Estas diretrizes devem ser elaboradas tendo como alicerce os Direitos humanos e os princípios do Estado democrático de Direito, que tem como base a constituição (ROXIN. 2006, p.80-81).

O procedimento dogmático desta ideia possibilita e favorece a introdução de questionamentos político-criminais e empíricos, e faz com que a dogmática, encerrada em seu edifício conceitual pelas anteriores concepções de sistema, se abra para a realidade (ROXIN, 2006, p. 80-81).

 

          Nesta teoria de política criminal, Roxin afirma que a mesma deve ser elaborada diante dos princípios da dignidade da pessoa humana, princípio da intervenção mínima do Direito Penal, princípio da proporcionalidade da pena, princípio da legalidade, etc. (ROXIN, 2006, p. 80-82).

Esclarecendo, portanto, que a política criminal deve ter os olhos voltados para a sociedade com paridade, equidade, igualdade, isonomia (ROXIN. 2006, p. 80-82).

Meu ponto de partida é o seguinte: os limites da faculdade estatal de punir só podem resultar da finalidade que tem o Direito Penal no âmbito do ordenamento estatal. Quero descrever esta finalidade de uma maneira que ela possa ser objeto de consenso na cultura ocidental e também em vastas partes do mundo. Penso que o Direito Penal deve garantir os pressupostos de uma convivência pacífica, livre e igualitária entre os homens, na medida em que isso não seja possível através de outras medidas de controle sócio-políticas menos gravosas (ROXIN, 2006, p. 32).

 

Para entendermos sua teoria, ele nos relata que devemos sempre analisar o caso concreto para posteriormente tentarmos aplicar os institutos penais da tipicidade, antijuridicidade e da culpabilidade (ROXIN. 2006, p. 37-39).

Por tanto nunca pré-fixando teorias antes da análise do caso in loco, isso para que cheguemos à conclusão se tal ação merece a intervenção do Direito Penal (ROXIN. 2006, p. 37-39).

O Projeto Governamental para um novo Código Penal alemão, de 1962, era de opinião diversa. Ele queria continuar a punir a homossexualidade e aludia a um Direito do legislador de “proibir penalmente também casos de comportamentos especialmente reprováveis do ponto de vista ético, ainda que de fato não seja imediatamente lesionado qualquer bem jurídico". Estes argumentos foram vencidos pela concepção de tutela de bens jurídicos por mim exposta (ROXIN, 2006, p. 38).

 

            No instituto Penal da conduta tanto omissiva ou comissiva, por exemplo, do sistema teleológico entende que este conceito não deve ser fixado antes do fato. Sendo assim, para que se consiga analisar o caso em concreto até concluir a conduta omissiva ou comissiva teve efetiva lesão ao bem jurídico. Logo, criando um risco socialmente inadequado. Desta forma, Roxin critica severamente a teoria finalista da ação e a teoria clássica ou causalista. (ROXIN, 2006, p.78-79). 

          Correspondentemente, estas duas teorias criam um conceito prévio de conduta. Sendo assim, na teoria finalista é valorizado excessivamente a finalidade do agente tendo como conceito de conduta o comportamento humano dirigido a um fim (ROXIN, 2006, p.78-79).

‘Entretanto, na teoria causalista se valoriza a relação entre a conduta e o resultado, tendo por este o conceito de conduta. Dessa forma, é o comportamento humano que produz um resultado. Portanto, ambas não analisam o caso concreto, pois estabelecem o conceito de conduta antes mesmo de ocorrer (ROXIN, 2006, p.78-79). 

 

Discutiu-se por bastante tempo se a casualidade, uma vez considerada elemento fundamental da realização do tipo, poderia dispensar um tratamento adequado aos delitos omissivos. Com a teoria finalista da ação surgiu ainda o problema a ser a culpa, constitutiva de certos tipos, poderia ser compreendida através do critério da finalidade (ROXIN, 2006, p.78-79).

 

            Na tipicidade, o sistema teleológico tem como escopo que o Direito é formado de regras e princípios. Regras é a norma casuística, já os princípios são quase em sua totalidade abstratos influenciando a elaboração das Normas, para a teoria clássica a tipicidade é a subsunção rígida ou fechada do fato à Norma (ROXIN. 2006, p. 81).

          Já o funcionalismo moderado propõe uma subsunção lógica aberta, enquadrando o fato em concreto aos princípios da política criminal, desta forma não sendo o bastante a adequação do fato à Norma, mas sim a verificação se realmente este fato feriu ou expôs a perigo de forma significativa o bem jurídico pela sociedade tido como relevante (ROXIN. 2006, p. 81).

A controvérsia a respeito da legitimidade ou não dos delitos de perigo abstrato, que hoje ocupa o centro das discussões fundamentais do Direito Penal — para ficar unicamente neste exemplo —, não pode ser decidida no sentido de uma aceitação ou negação em bloco, mas unicamente através de investigações, análises e valorações político-criminais dos perigos decorrentes de determinado comportamento para um bem jurídico concreto. Este procedimento vale não só para a apreciação político-jurídica de Normas já existentes, ou para fundamentar exigências a serem feitas de lege ferenda, mas também para os espaços interpretativos do Direito vigente. Aqui as ciências empíricas são necessárias mesmo para o trabalho dogmático (ROXIN, 2006, p. 81).

 

            Entre as duas teorias, a sua distinção é a Dogmática Penal, que são as normas vigentes que têm como subterfúgio de regulamentar o Direito Penal. Ou seja, o conjunto de regras e Leis que constituem o Direito criminal que na escola clássica é rígida. Dessa forma, basta a adequação do fato à Norma.

De outra forma, no sistema teleológico além de ter que se adequar o fato à Norma devemos também analisar se este fato realmente merece que o Direito Penal se debruce sobre ele. Pois, deve se verificar a real lesão ou ameaça ao bem jurídico para uma efetiva tipicidade (ROXIN. 2006, p. 37-39).

O exposto tem importância não só para os delitos sexuais, mas para o Direito Penal como um todo. Porque, também no caso de atualíssimos problemas de transplantes medicinais ou de tecnologia genética, o recurso a princípios éticos não é argumento suficiente para justificar uma Penalização (ROXIN, 2006, p.39).

 

Entretanto a culpabilidade no funcionalismo tem como conceito o juízo de merecimento da pena, ou seja, é o momento pelo qual o magistrado analisa se o réu merece ou não a pena a ser imposta. Contrariamente a teoria tradicional, pois o merecimento da pena é formado pelo livre arbítrio (poder de agir conforme o Direito). Dessa forma, tendo como base da culpabilidade a exigibilidade de conduta diversa.

Porém, para o funcionalismo não basta somente a exigibilidade de conduta diversa. Pois é preciso a necessidade preventiva, ou seja, analisa-se o caso concreto para constatar se a pena é necessária ao agente sobre a luz da política criminal. Desse modo, a pena para Roxin visa à proteção do bem jurídico. Portanto aplicada nos efetivos casos de seu ferimento ou ameaça concreta (ROXIN, 2006, p 85-89).

Contentar-se unicamente com a culpabilidade do autor o ponto de vista das teorias retributivas puras, segundo as quais o sentido da pena se encontra exclusivamente na compensação da culpabilidade. Corresponde a tal teoria retributiva tornar a punibilidade do autor que agiu ilicitamente dependente só de sua culpabilidade. Era, portanto, consequente que, na época do Direito Penal puramente retributivo [...] (ROXIN, 2006, p. 85).

 

          Na aplicação da pena deve ser necessária, como Roxin nos doutrina com a dicotomia do instituto da pena, dividindo-a em dois núcleos. De um lado, a prevenção geral e de outro a especial.

          A primeira deve ser vista sobre o escopo de intimidar a sociedade com o intuito que não se viole a Lei. Dessa forma, não ofenda o bem jurídico tutelado. De outro modo, a segunda, a específica, tem o caráter de segregar o agente da sociedade, para que não retorne a ferir o bem jurídico e ressocializá-lo para voltar ao convívio social(ROXIN, 2006, p 85-89).

Entretanto, somente há aplicação se for absolutamente necessária. Desta forma, usando a política criminal como lente para uma deslumbro efetivo dos princípios nela contidos. Evidente em todo seu raciocínio que a função do Direito Penal é proteger bens jurídicos, pois se a pena não tem este caráter não deve ser aplicada (ROXIN, 2006, p 85-89).

Tudo isto vale também para a dogmática, ou seja, para a determinação daquilo que é em si punível. Se a pena pressupõe culpabilidade, mas também uma necessidade preventiva de punição, é uma consequência necessária dessa concepção de fins da pena que também os pressupostos da punição devam ser medidos com base nesta premissa. A categoria do delito que se segue ao ilícito deve, portanto — obviamente, permanecendo-se vinculado à Lei —, tomar por objeto, além da culpabilidade, também a necessidade preventiva do sancionamento Penal, englobando as duas sob o conceito de "responsabilidade" (ROXIN, 2006, p. 89).

 

          Em última análise a esta teoria do sistema teleológico, não podemos deixar de falar na “antecipação do delito”, como já relatamos. Dentro do Direito Penal, o crime é o comportamento humano que lesa um determinado bem jurídico tutelado ou o coloca em perigo real (ROXIN, 2006, p. 31-32).

Algumas vezes o Direito Penal titula como crimes alguns comportamentos que não lesam ou não tem ameaça a nenhum bem jurídico, em casos excepcionais meros atos preparatórios são enquadrados como atitudes típicas dentro da escola clássica e também os conhecidos como crimes de perigo abstrato. Para a teoria do sistema racional final, o Direito Penal só deve incriminar os comportamentos que lesem ou exponham de forma concreta o bem jurídico a perigo, entretanto deve estes casos serem analisados um a um (ROXIN, 2006, p. 31-32).

Quero hoje tratar de um tema que se coloca nos ordenamentos jurídico-penais de todos os países, que se antepõe aos Direitos positivos nacionais e ainda assim é de igual importância para todos: a pergunta a respeito de quais comportamentos pode o Estado proibir sob ameaça de pena. A importância desta pergunta reside no fato de que de nada adiantam uma teoria do delito cuidadosamente desenvolvida e um processo Penal bastante garantista se o cidadão é punido por um comportamento que a rigor não deveria ser punível. (ROXIN, 2006, p. 31)

 

Abordando o ponto de definir, segundo ao Roxin o que seria bem jurídico para o Direito Penal, segundo sua teoria, devemos deixar bem claro que Direito Penal e moral são campos de estudos diversos, o grande papel do Direito Penal é a proteção de bens jurídicos socialmente relevantes (ROXIN, 2006, p. 33).

Todo o ato subjetivo em relação às pessoas não é penalmente relevante, somente os bens jurídicos tutelados pelo Direito Penal são relevantes para a sociedade. Sendo assim, são os delitos contra estes que devem ser reprimidos. Este pensamento da década de 70 veio a se concretizar no Direito brasileiro, no princípio da insignificância e também no Direito de bagatela, o qual iremos analisar mais profundamente no decorrer deste trabalho.

 

Para Roxin, não é possível extrair de dados pré-jurídicos soluções para problemas jurídicos, de modo que a teoria do delito tem de ser construída sobre fundamentos Normativos, referidos aos fins da pena e aos fins do Direito Penal, isto é, a política criminal. “O caminho correto só pode ser deixar as decisões valorativas político-criminais introduzirem-se no sistema do Direito Penal...” Com isso, Roxin delineia as bases de sua concepção funcional ou teleológico-racional da teoria do delito, que obteve vários adeptos dentro e fora da Alemanha. (GRECO, 2011, p. 107)

 

          Porém, para deixar claro que toda a ação que não for socialmente relevante em um contexto geral da sociedade não deve ser imposta ao Direito Penal, mas sim a outros ramos do Direito, “O Direito Penal é desnecessário quando se pode garantir a segurança e a paz jurídica através do Direito civil, de uma proibição de Direito administrativo ou de medidas preventivas extrajurídicas” (ROXIN, 2006, p. 33).

Chegamos, portanto, ao ponto de analisarmos o porquê do instituído do bem jurídico Penal, na visão de Roxin. Desta forma, a priori o bem jurídico ajudou a conter o legislador, logo servindo como freio de incriminações que a sociedade não via como efetivamente necessária para o seu convívio (ROXIN, 2006, p. 37-39).

Deste modo, o Direito Penal só deve ser utilizado para ações que de fato afetam o convívio social. Logo, o bem jurídico é algo sem o qual a sociedade não consegue sobreviver, já que são bens que devemos zelar para um convívio humanitário. Dessa forma, a proteção destes bens pelo Direito Penal deve ser efetiva, mas somente em casos que realmente haja lesão ou ameaça real desta(ROXIN,2006, p. 37-39).

 

A "dignidade humana" vem sendo recentemente utilizada na Alemanha e também na discussão internacional como um instrumento preferido para legitimar proibições penais. Segundo a concepção aqui defendida, tal será correto enquanto se trate da lesão à dignidade humana de o traz pessoas individuais. De acordo com a doutrina de Kant, decorre da dignidade humana a proibição de que se instrumentalize o homem, ou seja, a exigência de que "o homem nunca deve ser tratado por outro homem como simples meio, mas sempre também como fim". Quem tortura outrem para obter declarações, quem o usa em experiências médicas ou o violenta sexualmente, viola a dignidade humana da vítima e é justificadamente punido. Por esta razão contei já desde o início o respeito de uma assim entendida dignidade humana entre as condições de existência de uma sociedade liberal, introduzindo-o no conceito de bem jurídico por mim defendido (ROXIN, 2006, p. 39)

 

             Adentrando no cerne do nosso trabalho, após o esclarecimento necessário sobre as teorias de base do nosso pensamento, devemos nos deter em uma medida mais severa em relação ao bem jurídico tutelado, uma vez que nossa teoria de base se introduz fortemente neste conceito para sua total explanação.

 

  1. O BEM JURÍDICO TUTELADO E SUA FUNÇÃO ESTRUTURAL PARA O DIREITO PENAL.

 

          O Direito Penal tem como orientação que o bem jurídico seja a interligação entre o Estado a sociedade e a política criminal, pois é o momento em que se define o sentido e o caráter da punição, já que o Estado deve proteger para uma convivência ordeira e pacífica na sociedade. 

          Fábio Romeu Canton Filho nos revela que: 

O bem jurídico possui função estrutural no âmbito do Direito Penal, porém seu papel supera aquele de um alicerce que delineia aspectos puramente formais de sua efetivação jurídica, já que também lhe empresta um sentido, isto é, lhe atribui um conteúdo fundamental que o orienta e legitima. O bem jurídico, em outras palavras, não só assenta a pedra regular do Direito Penal, mas coroa o Norte de seu telospunitivo uma vez que constitui o elo entre as instituições penais do Estado e o ordenamento social no qual está inserido. (CANTON FILHO, 2012, p. 03)

 

          O código Penal não tem o carecer de amparo essencial da coletividade, mas sim a obrigação da efetivação de direito e princípios daqueles que transgridam a lei, de forma a que estes tenham todos os direitos e princípios concretizados.

Roxin deixa claro que o ordenamento Penal, como um todo, não apresenta em sua criação, ou até mesmo em sua intenção, que as pessoas sejam punidas. Logo, a visão do Direito Penal para Roxin é que o código Penal tem como finalidade assegurar que todos os transgressores da Lei Penal tenham afiançados todos dos Direitos e princípios para um julgamento justo e equitativo (ROXIN, 2012. P.20).

          O bem jurídico penal nos traz como finalidade relevante o emprego de um perigo inaceitável ou ainda o ferimento social deste bem, deixando de lado a formalização de um delito pela dogmática Penal. 

          Deste modo, a positivação de um determinado crime deve ser mais que puramente formal: devemos ter a materialidade deste crime, ou seja, um crime hipotético deve ferir ou colocar em um perigo tão grande o bem jurídico, que a sociedade elegeu para o Direito Penal assegurar, por isso a sua mera formalização não basta para evidenciar o crime.

Fruto de um ponto de partida positivista, chegou-nos um sistema classificatório, na forma de uma pirâmide conceitual, de modo bastante analógico ou sistema de plantas de Lineu: a construção erguesse da massa dos elementos do crime através de sucessivas abstrações, feitas estrato por estrato, até chegar ao conceito superior e genérico da ação. A causa pela qual um sistema fechado, surgido de tal maneira, nos afasta da solução de nosso problema, eu já tentei explicar: ele isola a dogmática, por um lado, das decisões valorativas político-criminais, e por outro, de realidades sociais, ao invés de abrir-lhe os caminhos até elas. (ROXIN, 2012, p.22-23)

 

          Roxin nos deixa claro que devemos deixar o dogma Penal um pouco de lado: devemos realmente analisar se um determinado crime, apesar de formal, teve sua efetividade de colocação em perigo ou ferimento de um determinado bem jurídico, para que este seja realmente colocado aos cuidados do Direito Penal. De outra forma devemos deixar outros ramos do Direito que cuida destes.

          O sistema Penal fechado ou a pura classificação formal de um delito não nos pode engessar de tal forma a excluir a política criminal. Devemos ter a exata noção que o Direito Penal está baseado nos princípios da intervenção mínima e no princípio da última razão. Por se tratar de a forma mais penalizante do Estado, só deve ser imposto ao delinquente quando não houver outra forma de fazê-lo.

 

Uma tal tentativa, que vou apresentar em suas linhas fundamentais, precisa partir da premissa de que cada categoria do delito – tipicidade, antijuridicidade, culpabilidade – deve ser observada, desenvolvida e sistematizada sob o ângulo de sua função político-criminal. Essas funções são de espécies diversas: o tipo está sob a influência da ideia de determinação legal, a qual a legitimação da dogmática por muitas vezes é reduzida; os tipos servem, na verdade, ao cumprimento do princípio nullum-crimen, devendo ser estruturado dogmaticamente através dele. (ROXIN, 2012, p. 29-30)

 

          Temos que ter a ideia que não existe uma teoria fixa no que diz respeito ao bem jurídico penal. Para uma questão de contraponto, Jakobs, no seu livro proteção de bens jurídicos, nos revela que:

O resultado da teoria da proteção de bens jurídicos não se baseia em uma diretriz fixa, mas sim em sua multiformidade camaleônica: “proteção de bens jurídicos” – “Direito”, “bem” e “proteção” – quem se oporia a isso? Ou, como acertadamente afirmou Amelung, interesses são controversos, mas a sua aceitação é um problema que sequer de forma aproximada pode ser solucionado através da sua denominação. (JAKOBS, 2018, p 38)

 

          Portanto, o confronto entre a teoria de Jakobs e de Roxin em relação ao bem jurídico tutelado na esfera Penal nos deixa claro que o primeiro tem como intuito a formação de bens para a proteção estatal, ou seja, para assegurar o próprio dever de punir do Estado. 

          Contrariamente, o segundo visa ao convívio pacífico e ordeiro de uma sociedade equitativa, uma vez que o Direito Penal na visão de Roxin é um soldado a mando da sociedade, por isso devendo interferir somente no que lhe diz respeito, deixando os demais soldados, tais como o Direito administrativo e o Direito civil, a encargo de transgressões menos gravosas que não venham a ferir ou ameaçar o bem jurídico.

Eu parto de que as fronteiras da autorização de intervenção jurídico Penal devem resultar e uma função social do Direito Penal. O que está além desta função não deve ser logicamente objeto do Direito Penal. A função do Direito Penal consiste em garantir a seus cidadãos uma existência pacifica, livre e socialmente segura, sempre e quando estas metas não possam ser alcançadas com outras medidas político-sociais que afetem em menor medida a liberdade dos cidadãos. (ROXIN, 2018, p. 16-17)

 

            Roxin tem como viés de sua teoria de bens jurídico, a qual está obrigatoriamente dentro do funcionalismo moderado, a visão de limitação do poder estatal, o qual se tem a concepção desde o contrato social, evidentemente o qual a sociedade passa para o Estado o dever de intervenção na esfera criminal, mas isso com o intuito unicamente de proteção e de segurança para uma vida e um convívio livre, somente portanto com esta finalidade o Direito Penal deve se impor, caso obviamente não tenha outra forma de fazê-lo, uma vez de formas mais brandas. (ROXIN, 2018, p. 17-18)

De tudo isto resulta: em um Estado democrático de Direito, modelo teórico de  Estado que eu tomo por base as Normas jurídico-penais devem perseguir somente o objetivo de assegurar aos cidadãos uma coexistência pacífica e livre, sob a garantia de todos os Direitos humanos, por isso, o Estado deve garantir, com os instrumentos jurídico-penais, não somente as condições individuais necessárias, para uma, coexistência semelhante (isto é, a proteção da vida e do corpo, da liberdade da atuação voluntaria, da propriedade, etc.), mas também as instituições estatais adequadas para este fim [...] (ROXIN, 2018, p. 17-18)

 

Assim, base de nossa matriz teórica, o Estado democrático de Direito tem como dever criar garantias para a vida social pacífica. Contudo esta forma de garantir a vida social, pela mesma razão, jamais deve estar impondo subterfúgios para uma punição visando ao mero impor da força estatal. Pelo contrário: deve limitar esta força.

Em suma, deixando claro que os bens jurídicos a serem protegidos são aqueles inerentes a uma vida ordeira, sendo assim somente em último caso, com a lesão desses bens ou uma ameaça dos mesmos, pode o Estado intervir perante os cidadãos.

Deste modo, bem jurídico tem como escopo primordial a defesa de institutos. Logo, para termos uma vida social com preceitos livres e pacíficos, isso denota ser tão forte ao ponto que o Estado somente pode intervir na vida social quando não houver outra forma de fazê-lo, 

Roxin deixa muito exposto que existe uma limitação do poder estatal para que jamais possa se interferir se não for em caso de ameaça ou ferimento insuportável do bem jurídico, e por este motivo, esta limitação do poder estatal tem como viés a intervenção mínima do Estado.

 

O Direito Penal, conforme abalizada doutrina, somente deve “preocupar-se”, ou melhor, conferir proteção aos bens mais relevantes e necessários à manutenção pacífica da sociedade. Partindo-se desta premissa, passamos ao estudo do postulado da intervenção mínima, ou última ratio do Direito Penal. Com escopo em reduzir o raio de incidência da seara Penal, o princípio da mínima intervenção, subtraí do resguardo daquele os bens passíveis de proteção por outros ramos do Direito. Ora, o Direito Penal deve interferir o menos possível na vida em sociedade, devendo ser vindicado somente quando os demais ramos do Direito não forem suficientes para proteger os bens de maior importância. (AMARAL, 2013)

 

          Tal intervenção somente se titula ou se torna legal a partir do momento em que o princípio da intervenção mínima for devidamente respeitado, juntamente com o princípio da legalidade já citado anteriormente, mas que tem como conceito principal quatro funções.

          A primeira é a proibição da retroatividade da Lei Penal, salvo em benefício do réu; a segunda, a proibição da criação de crimes e penas pelos costumes; a terceira a proibição do emprego de analogia para a incriminação, fundamentação ou agravamento de pena, e quarta, a proibição de incriminações vagas e indeterminadas.

Uma Lei indeterminada ou imprecisa e, por isso mesmo, pouco clara não pode proteger o cidadão da arbitrariedade, porque não implica uma autolimitação doius puniendi estatal, ao qual se possa recorrer. Ademais, contraria o princípio da divisão dos poderes, porque permite ao juiz realizar a interpretação que quiser, invadindo, dessa forma, a esfera do legislativo. (ROXIN, 2012)

 

          Portanto, devemos ter como certo a questão de que a teoria do bem jurídico tutelado está intrínseca ao princípio da legalidade e por sua vez deriva o princípio da intervenção mínima igualmente ligado em uma derivação mais teórica, criando, logo, o princípio da nullumcrimennullapoenasine lege, todos ajustados advindo o princípio da insignificância que teve como seu moldador ClausRoxin.

 

  1. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA SUAS CONCEPÇÕES ESTRUTURAIS

 

É necessário definir a palavra princípio, uma vez que a sua definição não está atribuída de forma solitária a um dos alicerces do Direito Penal. Trata-se de uma construção doutrinária racional e lógica derivativa de uma construção sistemática, que, segundo Lopes, doutrina. Tem o significado de:

[...] a palavra princípio é equivocada. Aparece com sentido diversos, podendo significar começo ou início. Princípio é, por definição, mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele; disposição fundamental que se irradia sobre diferentes Normas compondo-lhes o espírito e servindo de critério para sua exata compreensão e inteligência, exatamente por definir a lógica e a racionalidade do sistema Normativo, no que lhe confere à tônica e lhe dá sentido harmônico. (LOPES. 2000, p. 33)

 

Seguindo esta linha de raciocínio, na mínima transgressão há um princípio que fere o ordenamento jurídico como um todo, afetando as bases estruturais de todo um sistema jurídico, no caso do nosso tema jurídico Penal, além de uma construção doutrinária, sendo assim ofensa esta inadmissível, constituindo uma das maiores falhas dentro do Direito como um todo.

Violar um princípio é muito mais grave do que transgredir uma Norma. A desatenção aos princípios implica ofensa não apenas a um específico mandamento obrigatório, mas a todo o sistema de comando. É a mais grave forma de ilegalidade ou inconstitucionalidade, conforme o escalão do princípio atingido, porque representa insurgência contra todo o sistema, subversão de seus valores fundamentais. (LOPES, 2000, p, 33)

 

Portanto, a mínima ofensa ou deslize aos princípios, que tem como obrigação dar alicerce a todo Direito Penal e a Norma Penal, deve ser vista com repudia, uma vez que o Direito Penal deriva de princípios básicos para a limitação do poder estatal, para que o Estado não interfira na vida privada de seus cidadãos. Veremos agora alguns dos princípios que têm como base norteadora o próprio princípio da insignificância. 

Tais princípios básicos, embora reconhecidos ou assimilados pelo Direito Penal, seja através de Norma expressa, seja pelo conteúdo de muitas Normas e eles adequadas, não deixam de ter um sentido programático, e aspiram ser a plataforma mínima sobre a qual possa elaborar-se o Direito Penal de um Estado democrático de Direito. [...] são cinco princípios básicos do Direito Penal: legalidade (ou reserva legal, ou intervenção legalizada); intervenção mínima lesividade; humanidade e culpabilidade. (LOPES, 2000, p. 35)

 

O princípio da insignificância, destarte resulta do princípio da intervenção mínima. Nas palavras de Roxin: “a intervenção mínima surgiu no cenário jurídico com a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, como modo de garantir que a intervenção estatal no plano individual se dê apenas quando estritamente necessária” (ROXIN, 2006, p. 71).

Por consequência é uma implicação natural do princípio da legalidade, que se divide em formal e material, no caso do primeiro, nos revela que a Lei necessita ser antecessora ao fato e a ela deve se ter uma pena atribuída. Assim, os ensinamentos de Bernardes nos relatam: 

O princípio da Legalidade é basilar ao Direito Penal democrático, Irradia efeitos em duas vertentes: formal e material. Em decorrência da primeira, extrai-se que somente uma Lei prévia pode definir condutas reputadas como delituosas e estabelecer as respectivas sanções penais (postulados de reserva legal e da irretroatividade, cuja ressalva se dá quando a nova disposição legal seja mais favorável ao réu) (BERNARDES, 2019, p. 14-15) 

 

De outro modo a segunda, ou seja, a material, prevê que a Lei deve ser certa, clara e taxativa, como o próprio Bernardes nos deixa claro no seu relato:

A garantia da Lei certa ou taxativa prevê que a Norma penal incriminadora preveja e descreva a conduta reputada como criminosa e precisa. “como fonte formal exclusiva do Direito Penal, torna-se exigência democrática que a Lei Repressiva seja formulada com toda a clareza e objetividade, quanto às hipóteses em abstrato e genérica por ela alcançadas”. (BERNARDES, 2019, p. 15-16) 

 

 Este princípio da legalidade surge historicamente na humanidade como uma forma de limitação do poder punitivo do Estado. Ele surge no contexto da revolução francesa, no Estado centralizado no qual é necessário haver uma separação de poderes. Desta forma o limite do poder do Estado deve ser controlado. Em suma, uma das bases da democracia como um todo. (MANÃS. 2003, p. 143)

O fato é que, a partir das grandes codificações do século XIX, buscou-se o monopólio Penal do poder judiciário, uma das bases do Estado de Direito segundo o iluminismo, o qual também previa um Direito Penal simplificado e essencial. Entretanto, isso termina por abra

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